O Tribunal Superior do Trabalho (TST) começou a flexibilizar uma
jurisprudência de anos sobre o pagamento cumulativo dos adicionais de
periculosidade e insalubridade. Por unanimidade, a 7ª Turma da Corte admitiu
que as empresas paguem aos empregados os dois adicionais, desde que os fatos
geradores das verbas sejam distintos.
A decisão decorre de uma interpretação formada em abril pela
Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), e significa uma
revolução dos processos trabalhistas. Empresas, certamente, sofrerão uma
avalanche de processos sobre a possibilidade da cumulação de adicionais que
nunca foi admitida do ponto de vista da Consolidação das Leis do Trabalho
(CLT).
Até então, o entendimento do TST era de que o empregado deveria
optar pelo adicional de periculosidade – que é de 30% sobre o salário base – ou
o de insalubridade – que varia entre 10%, 20% ou 40% sobre o salário mínimo
regional.
A interpretação da instância máxima do Judiciário trabalhista
tinha por base o artigo 193 da CLT. Pelo dispositivo, são considerados como
atividades ou operações perigosas aquelas que, por sua natureza ou métodos de
trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do
trabalhador a inflamáveis, explosivos, energia elétrica, roubas ou outras
espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal
ou patrimonial.
A vedação ao pagamento cumulativo dos adicionais era justificada
pelo § 2º do artigo 193, segundo o qual “o empregado poderá optar pelo
adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido”.
Histórico
A reviravolta na jurisprudência do TST sobre o tema começou na 7ª
Turma, quando o colegiado admitiu o recebimento cumulativo, a partir do
julgamento realizado em abril de 2015 (RR-773-47.2012.5.04.0015).
Com ocasião, o colegiado, em voto de relatoria do ministro Cláudio
Mascarenhas Brandão, entendeu que a norma do artigo 193, § 2º da CLT, não teria
sido recepcionada pela atual Constitucional Federal de 1988.
Isso porque o artigo 7º, XXIII, da CF/88, teria garantido o
recebimento dos adicionais de insalubridade e periculosidade sem nenhuma
ressalva no que tange à cumulação. E tal conclusão se deu pelo fato de que, no
caso de insalubridade, o bem tutelado é a saúde do trabalhador, que está
submetido a labor em condições nocivas; ao passo que na periculosidade a situação
é distinta, uma vez que nessa hipótese há iminente risco de morte.
Desta forma, a legislação infraconstitucional (CLT, artigo 193, §
2º) deveria ser interpretada à luz da Carta da República, até para que houvesse
o efetivo alcance e finalidade da norma constitucional.
Ademais disso, com a ratificação pelo Brasil, as Convenções 148 e
155 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) passaram a integrar o
ordenamento jurídico pátrio. Logo, consoante decisão do STF, no RE
466.346-1/SP, as normas internacionais – no caso, convenções da OIT, que são
verdadeiros tratados especiais de direitos humanos – estão hierarquicamente
acima da legislação consolidada, haja vista o “status” de supralegalidade.
Sucede, porém, que ao analisar o assunto em abril, a SDI-1 reverteu
a decisão para não admitir o pagamento simultâneo dos adicionais. Mas os
ministros deixaram uma brecha ao afirmar que a vedação ao pagamento cumulativo
não é absoluta.
“Uma interpretação teleológica e afinada ao texto constitucional
da norma inscrita no artigo 193, § 2º, da CLT conduz à conclusão de que a opção
franqueada ao empregado, em relação à percepção de um ou de outro adicional,
somente faz sentido se se partir do pressuposto de que o direito, em tese, ao
pagamento dos adicionais de insalubridade e de periculosidade deriva de uma
única causa de pedir”, afirmou o ministro João Oreste Dalazen, relator do
ARR-1081-60.2012.5.03.0064 [os grifos são do relator].
Para o leitor leigo, parece difícil identificar quando os pedidos
ocorreriam da mesma causa de pedir e quando dizem respeito a fatos geradores
distintos. O próprio ministro Dalazen deu exemplos, no acórdão, para ajudar a
entender a nova interpretação da Corte.
Diz ele que o pedido teria como base o mesmo fato gerador no caso,
por exemplo, de um empregado de mineradora que tem contato com a detonação de
explosivos. Por estar exposto a ruído intenso, o empregado recebe o adicional
de insalubridade. Se o pedido para recebimento do adicional de insalubridade
for em decorrência do manuseio de explosivos, haveria a mesma causa de pedir,
ou seja, o trabalho relacionado à detonação de explosivos. Nessae caso, para o
TST, o trabalhador não teria direito ao pagamento cumulativo dos adicionais.
Situação diferente ocorre, para os ministros, no caso em que um
técnico de enfermagem postula adicional de insalubridade em decorrência do
contato com pacientes portadores de doenças infectocontagiosas e, também,
adicional de periculosidade em virtude do manuseio de equipamentos de raio-X,
porque sujeito a radiações ionizantes. Nesse caso, segundo o TST, haveria
causas de pedir distintas.
Depois da decisão da SDI-1, novamente a 7ª Turma do TST voltou a
analisar o assunto neste mês, a partir do Recurso de Revista
7092-95.2011.5.12.0030. Por unanimidade, os ministros condenaram a Whirlpool a
pagar a um ex-operador de fábrica:
– o adicional de insalubridade, pelo contato e manipulação de
produtos químicos e ruídos; e
– o adicional de periculosidade, pela exposição à radiação não ionizante.
– o adicional de periculosidade, pela exposição à radiação não ionizante.
“Restam expressamente delineadas premissas fáticas a demonstrar
que cada um dos adicionais em questão teve, comprovadamente, como fato gerador,
situações distintas”, afirmou o relator do caso, ministro Douglas Alencar
Rodrigues.
Ao assim decidir, o TST passa a conferir máxima efetividade ao
texto constitucional, afinal, enquanto o artigo 6º da CF/88 prevê a saúde como
um direito fundamental social, os artigos 170, 200 e 225, todos da Carta Magna,
garantem, por sua vez, a proteção do meio ambiente, nele compreendido o meio
ambiente do trabalho.
E tudo isso guarda sintonia com a previsão do artigo 196 da Lei
Maior, ao estabelecer que o direito à saúde deve ser garantido mediante
políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e outros
agravos.
OIT
Um dos fundamentos que havia sido acatado inicialmente pela 7ª
Turma, e afastado pela SDI-1, foi a de a regra da CLT violaria dispositivos das
Convenções 148 e 155, da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Para o ministro Dalazen, as convenções não contêm norma explícita
que garantam o pagamento cumulativao dos adicionais de periculosidade e de
insalubridade em decorrência da exposição do empregado a uma pluralidade de
agentes de risco distintos. “As Convenções 148 e 155, assim como é
característico das normas internacionais emanadas da OIT, ostentam conteúdo
aberto, de cunho genérico. Funcionam basicamente como um código de conduta para
os Estados-membros. Não criam, assim, no caso, direta e propriamente obrigações
para os empregadores representados pelo Estado signatário”, afirmou o julgador.
No entanto, a decisão da SDI-1 não afasta o entendimento no
sentido de que legislação internacional possui “status” supralegal, podendo ser
aplicada às situações ainda não reguladas por lei.
Bem por isso, se o pedido de cumulação decorre de uma única causa
de pedir, a percepção cumulada não será admitida. Em sentido oposto, se a
pretensão de cumulação dos adicionais se fundar em distintos fatos geradores,
pautados em causas de pedir diversas, a cumulação será deferida.
Essa parece, portanto, a melhor interpretação que se extrai da
decisão do TST, afinal, o empregado submetido a dois ou mais agentes nocivos,
díspares e autônomos, cada qual pautado em uma causa de pedir e suficiente a
gerar um adicional, tem inegável direito à cumulação por força do princípio da
igualdade.
A identificação dos fatos geradores deverá ser feita, regra geral,
mediante perícia, na forma do “caput” do artigo 195 da CLT, e os advogados dos
trabalhadores deverão identificar já na petição inicial quais as atribuições do
empregado que o levaram a estar sujeito a um ambiente insalubre e/ou de
periculosidade.
(*) Ricardo Calcini é Assessor de Desembargador no TRT/SP da 2ª
Região. Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Pós-Graduado em Direito Processual Civil pela Escola Paulista da Magistratura
do Tribunal de Justiça de São Paulo. Professor de Fabre Cursos Jurídicos,
Escola Nacional de Direito e Curso Êxito.
Fonte: JOTA, por Bárbara Pombo e Ricardo Calcini (*), 18.08.2016
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