Muitos Médicos do Trabalho defendem a idéia de que no ASO (Atestado de Saúde Ocupacional) devam constar apenas os dizeres: “apto” ou “inapto”. Eles justificam essa defesa no texto da própria Norma Regulamentadora n. 7 (NR-7).
Temos fortes reservas quanto a isso. Vejamos o que, de fato, diz a NR-7 em seu item 7.4.4.3, alínea “e”:
“O ASO deverá conter no mínimo: definição de apto ou inapto para a função específica que o trabalhador vai exercer, exerce ou exerceu.”
O termo “no mínimo” deixa margem à possibilidade de ampliação do conteúdo do ASO. O que a NR-7 estabelece é apenas o conteúdo mínimo.
Temos em nossa legislação trabalhista exemplos similares. O art. 58 da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) assim coloca:
“A duração normal do trabalho, para os empregados em qualquer atividade privada, não excederá de 8 horas diárias, desde que não seja fixado expressamente outro limite.”
Interpretando: nesse caso, a CLT demarcou o limite máximo da duração de trabalho em 8 horas por dia, o que não quer dizer que categorias específicas possam ter jornadas de trabalhos fixadas em tempos menores, como, por exemplo, 6 horas por dia (ex.: alguns bancários).
Pelo exposto, fica valendo o seguinte: ninguém poderá restringir / suprimir os direitos trabalhistas, mas unicamente aumentá-los / melhorá-los. Na mesma linha, vem o julgado a seguir:
EMENTA: “NORMA COLETIVA MAIS BENÉFICA – PREVALÊNCIA. A Constituição Federal reconhece a validade dos acordos e convenções coletivas (art. 7º, XXVI), sendo aplicável ao trabalhador a norma mais benéfica, independentemente da hierarquia kelseniana.” (Processo: 01681-2008-090-02-00-3)
Voltando à questão inicial, perguntamos: o termo “apto com restrições” (ou “apto com recomendações”) aumenta / melhora o direito dos trabalhadores? Entendemos que sim, pelos motivos que passamos a colocar:
a) vemos o “apto com restrições / recomendações” de forma mais inclusiva ao trabalho do que o simples “apto” ou “inapto”. Imaginemos, por exemplo, um “auxiliar de serviços gerais” que apresente algumas poucas e sérias restrições físicas. Suponhamos que, no exercício da função de “auxiliar de serviços gerais” houvessem várias atividades laborais, desde as mais leves até as mais pesadas. Nesse contexto, diante apenas das opções “apto” e “inapto”, talvez esse empregado se enquadrasse melhor na condição de “inapto”. No entanto, com a possibilidade da opção “apto com restrições / recomendações”, provavelmente ele assim seria qualificado;
b) ao elencar as restrições (no ASO, em relatório, e no prontuário médico), o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” mostrará também seu inquestionável senso de cuidado para com o trabalhador em análise. É importante lembrar que é obrigação do Médico do Trabalho (incluo aqui o “Médico Examinador” — grifo nosso) atuar visando, essencialmente, à promoção da saúde dos trabalhadores, conforme Código de Conduta do Médico do Trabalho. [ANAMT (Associação Nacional de Medicina do Trabalho), 2003].
c) o termo “apto com restrições” também tem o aval da ANAMT, conforme modelo de ASO elencado na Sugestão de Conduta Médico-Administrativa n. 6, 2001.
Assim, nosso entendimento caminha no sentido de que colocar no ASO os termos “apto com restrições” ou “apto com recomendações”, além de ser legal, é plenamente recomendável, pois caracteriza inquestionável zelo para com a saúde do trabalhador, além de ser um importante fator contribuinte de inclusão social.
Para que a saúde do(s) trabalhador(es) não seja(m) colocada(s) em risco, vale ratificar que as restrições / recomendações devem estar detalhadamente expressas, de forma escrita, no próprio ASO, além de serem verbalmente comunicadas ao empregador (ou a quem por ele responda) pelo Médico do Trabalho / “Médico Examinador”. Isso não deve ser confundido com quebra de sigilo profissional, com fulcro no art. 76 do Código de Ética Médica:
“É vedado ao médico: revelar informações confidenciais obtidas quando do exame médico de trabalhadores, inclusive por exigência dos dirigentes de empresas ou de instituições, salvo se o silêncio puser em risco a saúde dos empregados ou da comunidade.”
No caso em tela, visando a preservação da integridade do empregado, a comunicação ao empregador quanto às limitações do examinado reveste-se de elevado senso de cuidado e zelo. Já o silêncio se configuraria como omissão e ofensa direta ao aludido art. 76 do Código de Ética Médica.
Cabe-nos ressaltar que preferimos o termo “apto com recomendações” ao termo “apto com restrições”. Motivo: conquanto a análise prática seja exatamente a mesma, o termo “recomendações”, além de evidenciar o cuidado do Médico do Trabalho / “Médico Examinador”, não dá margem a nenhum tipo de interpretação pejorativa ao empregado, diferentemente do uso do termo “restrições.”
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