Pular para o conteúdo principal

DEFICIT FUNCIONAL X INCAPACIDADE LABORAL


Um dos grandes dilemas da indenização por doenças ocupacionais e acidentes de trabalho tem sido a graduação do dano. A emenda constitucional 45 de 8 de Dezembro de 2004 em seu artigo 114 definiu a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho. Como parte desta avaliação, conforme artigo 950 do Novo CPC, se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.
Criou-se então um grande problema: Como valorar o dano? Seria necessário uma pericia médica para estabelecimento de nexo causal e posteriormente que o médico perito informasse qual a porcentagem de redução da capacidade laborativa. Com base neste grau de redução e o valor do salário do requente, o magistrado definiria o valor da indenização, através de pagamento de pensão mensal até aproximadamente os 74,6 anos (tábua do IBGE para expectativa de vida no Brasil), ou então determinando que o valor fosse pago de uma só vez
Os peritos para valoração do dando corporal frequentemente utilizam-se de tabelas, também chamadas de Baremos. Infelizmente no Brasil encontramos apenas as chamadas Tabelas da SUSEP e do DPVAT. A SUSEP foi criada para ser utilizada para determinar o valor da indenização a ser paga pelas seguradoras ao segurado que possua algum grau de deficiência permanente devido ao acidente, após conclusão do tratamento (ou esgotados os recursos terapêuticos para recuperação). Já a tabela da DPVAT foi criada para promover indenização pela cobertura de invalidez permanente por pessoa vitimada no Seguro Obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres. Existem ainda tabelas mais complexas e completas onde dentre eles destacam-se a Valoración de las discapacidades y del daño corporal de Louis Mélennec, os Baremos propostos pela comunidade europeia, em especial o Português e Espanhol, a Tabela Francesa, o Guides to the Evaluation of Permanent Impairment da American Medical Association, entre muitos outros.
Alguns advogados erroneamente criticam a utilização de tabelas internacionais por não estarem previstas na legislação nacional. Obviamente não estão previstas e por certo nunca estarão, pois trata-se matéria de conhecimento da área médica e não do Direito Os peritos utilizam-se dos estudos e conhecimentos médicos nacionais e internacionais para diagnóstico da doença, para análise do nexo causal e porque não poderiam utilizar para a valoração do dano?
Conceitos de Deficiência funcional, Incapacidade, Baremos
Deficiência (ou déficit) é toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica, podendo ser temporária ou permanente, alterando o estado de saúde de um indivíduo. O déficit funcional é um declínio, quando comparado a uma pessoa totalmente hígida e como característica tem o mesmo valor para todas as pessoas, independente da sua idade, sexo, posição social ou profissão. A valoração do deficit funcional traduz em números então a redução do potencial físico, psiquico e intelectual que estão relacionados com as sequelas das lesões ocorridas, independente da sua profissão. Importante ser salientado é que a existência de um deficit funcional permananente não implica necessariamente em uma incapacidade laboral específica.
Incapacidade é a redução ou impossibilidade de realizar uma tarefa específica (laboral ou social) e pode-se classificar em diferentes graus. A incapacidade afeta tanto a nível funcional ou situacional do dano. O conceito de incapacidade ou discapacidade é diferente do conceito de deficiência e é aplicado àquelas pessoas que, devido ao fato de possuírem alguma deficiência, apresentam limitações para o desempenho de algumas das atividades da vida diária. A incapacidade ou redução da capacidade laboral é uma limitação para uma tarefa específica em consequência a uma deficiência
A Invalidez pode ser conceituada como a incapacidade total, indefinida e insuscetível de recuperação ou reabilitação. Pode ser laboral ou civil no caso das pessoas que perderam sua autonomia e precisam de uma terceira pessoa.
O que temos então são dois conceitos distintos mas que se completam No âmbito da justiça do trabalho, trabalhadores que apresentam uma doença ocupacional ou uma sequela de acidente de trabalho, tem por certo um déficit funcional, mas não necessariamente uma incapacidade laboral. Podemos citar alguns exemplos:
Uma telefonista destra sofre um acidente de trabalho e perde a falange distal do 5º dedo da mão esquerda. Existirá um déficit funcional quando comparado com uma pessoa hígida, cujas tabelas podem informar um grau aproximado de 3 a 4%. Entretanto, para a função de telefonista existe redução da capacidade? Logicamente que não. Um auxiliar de produção apresenta uma perda auditiva leve, que produz um déficit funcional de cerca de 10%, porém é claro como a neve, que esta deficiência não se traduz em nenhum grau de incapacidade
A pergunta é: As tabelas (SUSEP, DPAVT, tabelas europeias, etc...) informam grau de incapacidade laborativa ou déficit funcional? A resposta é que informam unicamente o déficit funcional para todas as pessoas, independente da sua profissão. Portanto está definitivamente errado o perito que conclui seu laudo afirmando que determinado trabalhador apresenta tal grau percentual de redução da capacidade laborativa pela tabela da SUSEP. Peço aos curiosos (magistrados, advogados e peritos) que acessem o site http://www.susep.gov.br que irão se surpreender com a seguinte frase, in verbis: Se ocorrer uma lesão não prevista na tabela, a indenização é estabelecida tomando-se por base a diminuição permanente da capacidade física do segurado, independente de sua profissão. Portanto a própria SUSEP deixa bem claro que sua graduação se dá independente da profissão e portanto não serve para informar grau de redução de capacidade laboral. A propósito não existem tabelas no mundo que valoram a redução do grau de capacidade laboral para uma profissão específica e afirmo que nunca existirá.

Proposta para valoração do dano

A nossa proposta é a utilização pelo magistrado e pelos peritos das duas informações em conjunto. A primeira informação que o perito deve dar ao magistrado é qual o déficit funcional existente para aquela doença ou sequela de acidente, quando comparado a um indivíduo 100% hígido. Para isso pode o perito lançar mão da tabela da SUSEP, mas orientamos que busquem tabelas mais complexas e melhores como o Baremos Europeu, Espanhol, Argentino, Americano, etc, todos amplamente superiores.
Em seguida o perito deve informar ao magistrado qual a relação existente entre a deficiência e a incapacidade para a profissão específica. Para tanto propomos seguinte classificação

Observamos com esta classificação que conseguiremos indenizar mais adequadamente cada caso específico.
Se tivermos uma sequela, mas sem levar a incapacidade ou redução da capacidade laboral especifica (tipo 0), a parte autora poderá ser indenizada pelos danos materiais, estéticos e dano moral pelo acidente/doença, mas não terá direito à pensão mensal. Em contrapartida se a parte autora tiver um déficit funcional que leva à incapacidade laboral total para sua profissão específica (Tipo 2a ou 2b), não deve ter uma pensão mensal pelo valor do déficit, mas sim, deve receber 100% da pensão mensal. Apenas os casos intermediários com redução da capacidade laboral onde é necessário esforços suplementares ou pode ser reabilitado para uma profissão do mesmo nível de complexidade é que o pensionamento passa a ser pelo valor do déficit funcional



Exemplo do pedreiro e do pianista

a) Perda de parte dedo mínimo da mão esquerda (falange distal)
O pedreiro terá um déficit funcional fisiológico de aproximadamente 4% mas estará totalmente apto para o trabalho, sem restrições, apesar do déficit funcional fisiológico encontrado
O pianista terá o mesmo déficit funcional fisiológico de aproximadamente 4% sendo que as sequelas são compatíveis com a atividade profissional ou com trabalhos da mesma complexidade, mas implicam em esforços suplementares
b) Perda de 3 dedos da mão esquerda (5º, 4º e 3ºdedos)
O pedreiro terá um déficit funcional fisiológico de aproximadamente 30% sendo que as sequelas são compatíveis com a atividade profissional ou com trabalhos da mesma complexidade, mas implicam em esforços suplementares
O pianista terá o mesmo déficit funcional fisiológico de aproximadamente 30% porém as sequelas são totalmente impeditivas do exercício da atividade profissional

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

APTO COM RESTRIÇÕES

Muitos Médicos do Trabalho defendem a idéia de que no ASO (Atestado de Saúde Ocupacional) devam constar apenas os dizeres: “apto” ou “inapto”. Eles justificam essa defesa no texto da própria Norma Regulamentadora n. 7 (NR-7). Temos fortes reservas quanto a isso. Vejamos o que, de fato, diz a NR-7 em seu item 7.4.4.3, alínea “e”: “O ASO deverá conter no mínimo: definição de apto ou inapto para a função específica que o trabalhador vai exercer, exerce ou exerceu.” O termo “no mínimo” deixa margem à possibilidade de ampliação do conteúdo do ASO. O que a NR-7 estabelece é apenas o conteúdo mínimo. Temos em nossa legislação trabalhista exemplos similares. O art. 58 da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) assim coloca: “A duração normal do trabalho, para os empregados em qualquer atividade privada, não excederá de 8 horas diárias, desde que não seja fixado expressamente outro limite.” Interpretando: nesse caso, a CLT demarcou o limite máximo da duração de trabalho em

ACIDENTALIDADE POR CNPJ

Para realizar a consulta informe o CNPJ (apenas números) e o Código de Segurança e clique no botão "Pesquisar”. No campo "CNPJ" você poderá informar o CNPJ completo ou apenas os 8 primeiros números (Raiz do CNPJ), caso informe os 8 primeiros números o sistema retornará a lista de empresas, clique no CNPJ da empresa que desejar para acessar as informações de Acidentalidade. http://www.previdencia.gov.br/a-previdencia/saude-e-seguranca-do-trabalhador/acidentalidade-por-cnpj/